"Se
és a única pessoa a controlar a tensão do arco da tua vida, não irás longe.
Tens que permitir que Deus coloque a sua mão sobre a tua” (Simon Foster)
Angry
Birds é um jogo virtual popular no meu mundo pessoal. O conceito é muito simples:
uma mão cheia de pássaros zangados (Angry Birds) desejosos e aos pulos para
destruir os adversários Porquinhos Verdes. Mas, como eles não podem voar, é
necessário recuá-los no elástico de uma fisga gigante implantada no solo e projetá-los
nos ares a fim de ultrapassarem a distância e os obstáculos que os separam dos
Porquinhos, caindo sobre eles a fim de os desintegrar... Um pouco à semelhança
deste jogo, se queremos progredir e conquistar terreno em certas áreas da nossa
vida, por vezes temos que recuar um pouco agora para avançar mais tarde.
Vamos
a exemplos: preservar um relacionamento ou amizade que consideramos importante,
pode exigir que, em determinado momento, abdiquemos da razão, mesmo que esta
esteja do nosso lado. Ou fazer concessão dos nossos direitos, ainda que nos
pareça injusto. Tomar a iniciativa de promover uma reconciliação, ainda que a
ofensa tenha vindo da parte contrária. Sacrificar um pouco do nosso precioso
tempo de descanso e lazer para escutar os desabafos e dilemas de quem se esquece
de nos agradecer depois. Ou aceitar uma proposta de trabalho há muito desejada,
sujeita a uma remuneração inferior à que recebemos atualmente.
Quando
pensamos em recuar, perder, abdicar, sacrificar, ceder ou perdoar, de uma
perspetiva humana parece-nos um mau negócio que, à partida, não nos favorece nem
nos deixa bem na fotografia.
Mas
um aparente recuo pode, na verdade, resultar num largo passo em frente… ou até
vários! É o que eu chamo de “efeito fisga”. Tal como nos Angry Birds. No tiro
com arco, a força do nosso braço faz recuar a corda do arco, gerando uma certa
tensão que, uma vez libertada, projeta a flecha a uma distância muito maior do
que aquela que a fizemos recuar.
Este
é o dilema vivido por certos pais e que a passagem bíblica do Salmo 127:4 e 5 ilustra
tão bem: “Como flechas na mão do valente,
assim são os filhos da mocidade. Bem-aventurado o homem que enche deles a sua
aljava…”. Aqui, os pais são equiparados a um arqueiro e os filhos às
flechas na sua aljava. Cabe ao arqueiro retirar as flechas da aljava (ou zona
de conforto que pode ser o lar) a fim de, com a sua experiência e sabedoria,
apontá-las certeiramente, dar-lhes impulso e fazê-las voar bem mais longe do
que ele próprio conseguiu.
Mas
o relacionamento pais-filhos não se evidencia apenas nas ligações biológicas, podendo
manifestar-se em ligações espirituais que, não poucas vezes, se tornam tão ou
mais fortes que os laços de sangue.
Eventualmente,
podemos adoptar alguém que não tenha qualquer parentesco conosco como “filho” ou,
sem nada intencional fazermos por isso, sermos adoptados como “pais”. Seja qual
for o caso, nada nos iliba da responsabilidade de cuidar, encorajar e impulsionar
os filhos do coração a chegarem mais além do que nós próprios alguma vez conseguimos.
Porquê? Porque somos uma referência na vida deles e é exatamente isso que se
espera que um pai ou mãe façam, sejam biológicos ou não. Mas estes laços de
alma não surgem do nada. São fruto de amizade, amor e confiança construídos e
alimentados mutuamente ao longo do tempo.
Impõe-se
a interrogação: existe alguém próximo, que seja um mentor, uma inspiração, uma
referência na minha vida e que eu deva honrar como mãe ou pai espiritual? Ou
haverá quem me considere como tal e necessite apenas de um minuto da minha atenção
ou de uma palavra de encorajamento? Um coração de pai ou mãe nunca cessa de
bater pelos seus filhos, biológicos ou não.
Carlos Pinto Leite
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