29/12/2012

A CORRIDA INTELIGENTE




 Hoje vou correr novamente os 10 km da S. Silvestre de Lisboa e, por uma série de sucessivos contratempos, situações inesperadas e urgências familiares, não estou, nem de perto nem de longe, preparado como gostaria para este desafio. Desta vez, a quilometragem que consegui acumular nas pernas é manifestamente escassa, a frequência e o número de horas de treino são insuficientes, estou muito aquém do meu ritmo normal de treino e as vias respiratórias ainda se ressentem de uma constipação. Mas, mesmo assim, vou! Vou correr, vou competir, embora, à partida, as condições não sejam as ideais nem tão pouco favoráveis para obter uma boa classificação. Por isso, terei obrigatoriamente que realizar uma corrida inteligente, maximizando os poucos recursos disponíveis de momento a fim de obter o melhor resultado possível. Caso contrário, a alternativa será “encostar à box” a meio do percurso. E já delineei uma estratégia.



1 - Iniciarei com uma boa sessão de aquecimento, alongamentos e sprints selvagens estilo Porsche para aterrorizar e desencorajar logo à partida os mais diretos rivais. Tunga!


2 – Procurarei partir o mais à frente possível, tendo já em mente as centenas de invejosos que de certeza me quererão ultrapassar só para me contrariar. Mas um atleta de (baixa) competição tem de saber lidar com este tipo de situações, por isso colar-me-ei no seu encalço, usando-os descaradamente como quebra-vento, o que me permitirá poupar algumas energias. Toma!


3 – Farei a corrida possível, doseando o esforço. A cada tiro de partida, há sempre alguns campeões valentaços que explodem em correria desenfreada para chiarem como balões vazios quilómetros adiante. O segredo está em dosear o esforço, considerando todas as dificuldades que surgirão durante o percurso.


4 – Há um momento da corrida que é crucial e decisivo para a forma como a vamos terminar e é nesse momento que temos de atacar. O ataque exige sempre de nós uma dose adicional de esforço, energia e sacrifício, mas é absolutamente essencial para nos dar aquele impulso que nos garanta uma maior vantagem sobre os restantes corredores. Há quem tenha excelente ponta final e aguarde os derradeiros quilómetros para desferir o ataque. Eu prefiro fazê-lo nas subidas. Quando a maioria bufa e espuma para chegar ao final da subida, eu faço questão de esboçar um sorriso idiota e alargar o passo. Serão 3 km a subir, desde os Restauradores até à rotunda do Saldanha…


5 – A chegada à meta pode ser algo apocalíptica: ficamos felizes por ultrapassar a 100 metros do final um gordo careca que nos desafiou até ali e, simultaneamente, somos passados para trás por um peso pluma de 13 anos mesmo em cima da meta.


Seja qual for o alvo que nos propomos atingir, a meta que queremos alcançar, não devemos, não podemos estar à espera de reunir primeiro todas as condições ideais e que julgamos necessárias para então agirmos. Caso contrário, nunca passaremos das intenções à ação.
 
Importa começar a corrida. Planear, sim, mas também começar. Com todos os recursos que temos à mão, mesmo que poucos. Com as condições que temos, mesmo não sendo ideais. E fazermo-nos à estrada, desenvolvendo uma corrida inteligente, explorando ao máximo os trunfos que temos disponíveis. No mínimo, os resultados que podemos esperar serão surpreendentes. Ou, em alternativa, resta-nos ficar eternamente à espera de um tiro de partida que já soou há muito tempo atrás.